Pelas evidencias que temos até hoje, parece haver três
maneiras de conviver com a insegurança; talvez com o tempo sejam inventadas outras, mas
suspeito de que estas três venham a ser apenas aperfeiçoadas, se é que tal
termo se aplica.
A primeira maneira é deixar o perigo reinar
absoluto e deixar que os infelizes que defrontarem com ele sofram as consequências.
Essa é a política adotada atualmente com relação aos conjuntos habitacionais de
baixa renda e vários outros, de renda média.
A segunda maneira é refugiar-se em
veículos. Esse recurso é utilizado nas grandes reservas de animais selvagens na
África, nas quais os turistas são advertidos a não sair do carro em hipótese
alguma até que cheguem ao alojamento. Essa prática é também empregada em Los
Angeles.
Os visitantes desta cidade não se cansam de contar, surpresos, que a
polícia de Beverly Hills os parou, pediu que justificassem por que estavam a pé
e os advertiu do perigo. Esse recurso de segurança do público parece ainda não
funcionar bem em Los Angeles, como demonstram os índices de criminalidade, mas
talvez, com o tempo, venha a funcionar. Imaginem quais não seriam as taxas de
criminalidade se pessoas sem carapaças metálicas se expusessem na vasta e
desguarnecida reserva de Los Angeles.
As pessoas que se encontram em locais perigosos
de outras cidades também costumam utilizar automóveis como proteção, é claro,
ou pelo menos tentam. Uma carta endereçada ao editor do New York Post diz: “Moro
numa rua escura, travessa da Avenida Útica, no Brooklyn, e por isso decidi
tomar um táxi para chegar à minha casa, embora não fosse tarde. O motorista
pediu que eu descesse na esquina da Útica, dizendo que não queria entrar na rua
escura. E eu precisaria dele se quisesse andar por uma rua escura?”.
A terceira maneira, que já mencionei ao
abordar o Hyde Park-Kenwood, foi criada por bandos de arruaceiros e abertamente
adotada pelos criadores da cidade reurbanizada. Essa modalidade consiste em
cultivar a instituição do Território.
Segundo a modalidade tradicional do sistema
do Território, uma gangue apropria-se de certas ruas e conjuntos habitacionais
ou parques – geralmente uma combinação dos três. Os integrantes de outras
gangues não podem entrar nesse Território sem a permissão de seus
proprietários, e se o fizerem correm o risco de ser espancados ou enxotados. Em
1956, o Conselho Juvenil da cidade de Nova York, desesperado com a guerra de
gangues, obteve, por meio de seus funcionários, uma série de tréguas entre os
grupos rivais. Diz-se que as tréguas estipulavam, entre outras condições, o
reconhecimento mútuo das gangues a respeito das fronteiras do Território e um
acordo de respeitá-las.
O comissário de polícia, Stephen P.
Kennedy, declarou-se, logo em seguida, ultrajado com os acordos sobre os
territórios. A polícia, disse ele, procurava garantir o direito de qualquer
pessoa de transitar em segurança em qualquer local da cidade, tendo por direito
fundamental a imunidade. Os pactos sobre os territórios, assinalou ele,
subvertiam intoleravelmente os direitos do cidadão e a segurança pública.
Acho que o comissário Kennedy tinha toda a
razão. Porém, precisamos refletir sobre o problema que os funcionários do
Conselho Juvenil enfrentavam. Era um problema real, e eles estavam tentando
resolvê-lo da melhor maneira possível, com os meios empíricos de que dispunham.
Nas ruas, nos parques, e nos conjuntos habitacionais malsucedidos dominados por
essas gangues, faltava segurança pública, da qual fundamentalmente dependem o
direito e a liberdade de ir e vir da população. Sob tais circunstâncias, a liberdade
do cidadão não era senão um conceito teórico.
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