quarta-feira, 29 de abril de 2015

Usar o sofrimento alheio, sem a menor intenção de ajudar

Há algum tempo assisti uma exposição acadêmica sobre as condições a que submetemos nossos adolescentes/jovens, durante o cumprimento de medidas sócio-educativas (é a popular “cadeia para os ‘di menor’”).

O ambiente é insalubre ao extremo, a convivência entre os menores e os agentes – bem como entre internos – não é, nem de longe, a ideal, em outras palavras, um depósito de gente “má”, aos moldes de um campo de concentração. Tal contexto parece-me produzir um contingente criminoso, egresso, com mais “qualificações para o delinquir”, isto é, bandidos mais violentos, mais íntimos de práticas amedrontadoras e prontos para adentrar o mundo adulto criminoso.

Na fala de um dos internos entrevistados salta a frase: Isso aqui é um inferno na Terra!

Chamou a atenção - de tudo que vi, ouvi e assisti -, aquilo que não vi, não ouvi e não assisti. Não vi nenhuma imagem das residências dos internos, não ouvi nada a respeito das condições de vida e contexto social e não assisti, em nenhum vídeo, cenas do cotidiano de jovens/adolescentes em condições similares às dos internos pré privação da liberdade.

O assunto parece ser um tabu.

Não houve senso prático honesto, pelos expositores, restringiram seu olhar ao Estado que maltrata os internos.

Quem expõe o Estado que maltrata adolescentes/jovens antes da privação da liberdade, aqueles que delinquem e, sobretudo, aqueles que são vítimas dos delinquentes?

Há debates sobre (in)Segurança Pública, mas não há debates acalorados sobre Justiça. Fala-se muito da ação policial, especialmente as que resultam em violações dos direitos humanos, mas, paradoxalmente, os Direitos Humanos, em si, não recebem holofotes sem alguma denúncia de desrespeito à dignidade da pessoa humana.

segunda-feira, 20 de abril de 2015

Causas causadas e causas causantes

Durante entrevista, no programa Roda Viva, de 4 de março de 1991, o então Deputado Federal, Roberto Campos, argumenta que há causas que se originam em causas anteriores, ou seja, causas causadas por causas causantes.

Um contexto posto, tratado como efeito, tem suas causas imediatas, e estas, por sua vez, também tem suas origens em outras causas, as tais “causas causantes”.

O artigo que trago a este blog (Europa anuncia medidas para conter fluxo de imigrantes) informa sobre o aumento na intensidade das rotas marítimas, clandestinas, com origem no norte da África, a caminho do sul da Europa (Itália, Grécia, Espanha); segundo o dirigente da ONU o caminho mais mortal da Terra.

A causa causada é o contexto caótico (social, político, econômico) vivenciado por populações, que vislumbram, na fuga, sua única possibilidade de vida digna. As causas causantes são as ações e omissões dos gestores públicos de países africanos (segundo a reportagem, Líbia, Egito, Sudão, Eritréia, Somália, dentre outros), a construir um contexto insuportável, violento e inseguro.

O contexto (insuportável, violento e inseguro), por seus resultados, é o alvo de Políticas Públicas de Segurança e das Políticas de Segurança Pública.

Desde as UPP, do Rio de Janeiro, às diretrizes para ações junto aos viciados da Cracolândia, em São Paulo, a pedra de toque é o contexto gerador de problemas e, sobretudo, as causas do contexto.

Para entender as causas causadas, parafraseando o Deputado Roberto Campos, é preciso conhecer as causas causantes.

Uma pesquisa séria, isenta e científica buscará examinar, como objeto de estudo, as “causas causantes” do contexto de violência e insegurança pública.

Até o momento tem sido mais fácil, e midiático, atacar ações policiais e o "sistema" - o "sujeito indeterminado" da análise sintática do contexto de insegurança pública.