sábado, 7 de fevereiro de 2015

O uso de armas não letais representa avanço tecnológico e conceitual, na redução do crime e controle da violência

Após saudar a aprovação da lei 13.060/14 (na postagem “Mais laranja, menos cinza-chumbo”), me deparo com o artigo “Uso de armas não letais: avanço ou retrocesso?”, da lavra do policial Moacir Maia[1], importante voz no contexto da Segurança Pública no Brasil.

Em linhas gerais, o articulista expõe suas preocupações com a ordenação legal (Lei Federal 13.060/14) no sentido do uso de tecnologias não-letais por funcionários encarregados da aplicação da lei. O cerne da resistência ao uso gradual da força, pelo autor, reside no risco que tal conceito de atuação policial pode, em tese, trazer ao policial em serviço.

A primeira linha de argumentação refere-se ao, hipotético, contrassenso de oferecer meios não-letais a quem é treinado para a letalidade, sic. Este ponto descortina, data maxima venia, um equívoco em relação ao entendimento da ação policial, no controle do crime e violência - preocupante, visto que é emitido por um policial de relevante posição, formador de opinião.

Ocorre que a policial e o policial não são treinados para a letalidade, nem poderiam ser, visto que:

A garantia dos direitos do homem e do cidadão necessita de uma força pública; esta força é, pois, instituída para fruição por todos, e não para utilidade particular daqueles a quem é confiada (Artigo 12º da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão. França, 1789. Grifo nosso).

O preparo policial é estabelecido, nos dizeres da Constituição Brasileira, “[...] para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio [...]”[2]. Neste diapasão torna-se dissonante a pregação de que a Polícia tem inimigos, em seu exercício laboral; ao contrário disto, a Polícia tem uma sociedade a servir e proteger.

Em termos conceituais, negar aos funcionários encarregados da aplicação da lei o uso de equipamentos e materiais não letais, indica, por absurdo, que qualquer ação policial, que escape ao controle produzido pela ostensividade, deva ser solucionado “a bala”.

Por ter militado no atendimento à população por mais de três décadas, especificamente na Segurança Pública, entendo claramente a preocupação do colega Moacir Maia, entretanto os argumentos de que o exercício profissional é perigoso e de que a Força Pública “sai a campo” em meio a inimigos, para matar ou morrer, me parecem equivocados, a Polícia deve buscar preparo (tecnológico e operacional) constantemente, com o fito de atender melhor à sociedade.

Não é razoável que o policial primeiro seja alvejado para então sacar sua arma, todavia também não é razoável que os profissionais de segurança pública entrem de armas em punho, numa residência, para o atendimento a uma briga entre marido e mulher, ou mesmo uma perturbação do sossego (ocorrências campeãs de atendimento pela Polícia).

O uso gradual da força é um conceito internacionalmente reconhecido, que visa, justamente, apontar o melhor caminho, quanto à contenção, durante o atendimento policial. Resistir ao uso de tecnologias não letais significa expor profissionais de segurança pública a excessos e erros irreparáveis, por seus efeitos.



Por fim, argumentar que os profissionais em Segurança Pública estão preocupados com o direcionamento, legal, para uso de tecnologias não letais, indica que a questão é solucionável por treinamento e produção de conhecimento sobre o assunto e não, simplesmente, resistir ao uso operacional.




[1] Bacharel em Ciências Econômicas, Escrivão de Polícia Civil, Presidente da AEPOL e Vice-Presidente do SINPOL-AM.
[2] Caput do artigo 144 da Constituição Federal do Brasil.

segunda-feira, 2 de fevereiro de 2015

“Não faz assim que é feio!”

Justamente num concurso de beleza, por paradoxal que seja, o ponto de destaque foi uma atitude deselegante e “feia”. Inconformada com a não-escolha, a segunda colocada do Miss Amazonas 2015, arranca a coroa da cabeça da campeã do concurso.

Há algumas publicações, tenho refletido sobre o enfraquecimento do controle social informal, ao ponto de que a inanição deste o tornou praticamente inexistente. O termo “controle social informal”, neste texto, aplica-se a todos os “freios” às nossas condutas que não os providos, formalmente, pelo Estado.

Partilho com o leitor a definição de Controle Social, a partir do Lombroso’s blog:

Segundo, Molina[1] o Controle Social se expressa como o conjunto de instituições, estratégias e sanções sócias que pretendem promover e garantir a submissão do indivíduo aos modelos e normas comunitárias. Pode ser dividido em duas instâncias: controle social formal e informal. O primeiro grupo é formado pelos órgãos estatais que compõem o sistema de justiça criminal: polícia, justiça, administração penitenciária, enquanto que o controle social informal é aquele exercido pelos grupos sociais, ou seja, família, escola, profissão, opinião pública dentre outros.
Tomo a liberdade de alinhar o conceito e aplicação de controle social informal à frase que as mães (responsáveis, tias, professoras, cuidadoras, etc) repetiam, como alerta, antecedente a castigos mais sérios, a crianças “arteiras”: “Não faz assim que é feio!”.

O sentido da frase reside no fato de que ninguém quer fazer “coisas feias”, para evitar vergonha, reprovação, arrependimento...

A questão da Miss Terra Amazonas[2] me remete à reflexão de que estamos diante de uma alta produção de pessoas que percebem-se como “centro do universo”, insubstituíveis; aos quais todos devem reverenciar, prestar atenção, ouvir; dotados de muitos direitos e pouquíssimos deveres.

Há uma indicação clara de que a sociedade está composta por um número crescente de gente que não teme a vergonha, a desaprovação, a reprovação social, penso que chegam às raias do não reconhecimento destes freios. Parece que estão acima dos demais, têm direito a expressar seus sentimentos, opiniões e argumentos sem restrição de hora e local, inclusive com uso de violência física, como o fato de que arrancar à força a coroa da Miss Amazonas 2015.

Provavelmente a agressora não buscava a revogação da decisão em favor de sua concorrente, “apenas” discordou dos votos e “manifestou” seu descontentamento.

Tem-se aí, neste caso específico, uma atitude que não é isolada. Se o aluno chega à conclusão de que o professor não o ensina adequadamente, ele tem o “direito” de se manifestar, mesmo que agredindo-o, etc...

Lembro as palavras de um comandante de policiamento, chamado por clérigos para explicar a crescente violência e criminalidade numa cidade do interior paulista:

Se vocês estivessem com o "rebanho" de jovens aqui na igreja, eles não estariam cometendo crimes lá na rua.




[1] MOLINA, Antonio García-Pablos de; GOMES, Luiz Flávio. Criminologia: introdução a seus fundamentos teóricos. 3. ed. rev., atual. e ampl. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2000.
[2] Título reservado à vice-campeã, do qual, aliás, a agressora foi alijada.