Após saudar a aprovação da lei 13.060/14 (na
postagem “Mais laranja, menos cinza-chumbo”), me deparo com o artigo “Uso de armas não letais: avanço ou retrocesso?”, da lavra do policial Moacir Maia[1],
importante voz no contexto da Segurança Pública no Brasil.
Em linhas gerais, o articulista expõe suas
preocupações com a ordenação legal (Lei Federal 13.060/14) no sentido do uso de
tecnologias não-letais por funcionários encarregados da aplicação da lei. O cerne
da resistência ao uso gradual da força, pelo autor, reside no risco que tal conceito
de atuação policial pode, em tese, trazer ao policial em serviço.
A primeira linha de argumentação refere-se
ao, hipotético, contrassenso de oferecer meios não-letais a quem é treinado
para a letalidade, sic. Este ponto descortina, data maxima venia, um equívoco em relação ao
entendimento da ação policial, no controle do crime e violência - preocupante,
visto que é emitido por um policial de relevante posição, formador de opinião.
Ocorre que a policial e o policial não são treinados
para a letalidade, nem poderiam ser, visto que:
A garantia dos direitos do homem e do cidadão necessita de uma força pública; esta força é, pois, instituída para fruição por todos, e não para utilidade particular daqueles a quem é confiada (Artigo 12º da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão. França, 1789. Grifo nosso).
O preparo policial é estabelecido, nos
dizeres da Constituição Brasileira, “[...] para a preservação da ordem pública
e da incolumidade das pessoas e do patrimônio [...]”[2]. Neste
diapasão torna-se dissonante a pregação de que a Polícia tem inimigos, em seu exercício
laboral; ao contrário disto, a Polícia tem uma sociedade a servir e proteger.
Em termos conceituais, negar aos funcionários
encarregados da aplicação da lei o uso de equipamentos e materiais não letais,
indica, por absurdo, que qualquer ação policial, que escape ao controle
produzido pela ostensividade, deva ser solucionado “a bala”.
Por ter militado no atendimento à população
por mais de três décadas, especificamente na Segurança Pública, entendo
claramente a preocupação do colega Moacir Maia, entretanto os argumentos de que
o exercício profissional é perigoso e de que a Força Pública “sai a campo” em
meio a inimigos, para matar ou morrer, me parecem equivocados,
a Polícia deve buscar preparo (tecnológico e operacional) constantemente, com o
fito de atender melhor à sociedade.
Não é razoável que o policial primeiro seja
alvejado para então sacar sua arma, todavia também não é razoável que os profissionais
de segurança pública entrem de armas em punho, numa residência, para o
atendimento a uma briga entre marido e mulher, ou mesmo uma perturbação do
sossego (ocorrências campeãs de atendimento pela Polícia).
O uso gradual da força é um conceito internacionalmente reconhecido, que
visa, justamente, apontar o melhor caminho, quanto à contenção, durante o
atendimento policial. Resistir ao uso de tecnologias não letais significa expor profissionais de segurança pública a excessos e erros irreparáveis,
por seus efeitos.
Por fim, argumentar que os profissionais em
Segurança Pública estão preocupados com o direcionamento, legal, para uso de
tecnologias não letais, indica que a questão é solucionável por treinamento e
produção de conhecimento sobre o assunto e não, simplesmente, resistir ao uso
operacional.