domingo, 30 de junho de 2013

Tolerância à diversidade como estímulo à convivência pacífica

As manifestações que ocorrem no Brasil nos últimos dias apontam várias questões que merecem atenção, mas quero destacar uma em especial (conforme entendo), qual seja, a busca pela “aprovação do grupo”.

É possível dizer, grosso modo, que as pessoas se aglutinam pelo fator geográfico e também pelo compartilhamento de histórias de vida semelhantes, e assim se formam grupos sociais.

Os grupos se formam e a manutenção destes, dentre outros fatores, se dá em consequência da adequação/submissão dos integrantes/indivíduos ao código de conduta de cada grupo, o que equivale a dizer que cada participante, ao seguir as regras do grupo, manifesta seu interesse em conquistar a aprovação dos demais, visto que, normalmente, o código de conduta é a expressão daquilo que o “grupo” entende como o mais correto, o que pode ser chamado de “controle social informal”, visto que os “pares” exercem o controle informalmente.


Se os códigos de conduta dos grupos de jovens/adolescentes geram sentido sobre seus componentes, entendo que o Estado, de alguma forma, deveria contribuir com a construção de culturas de paz pela captação dos diversos grupos de jovens/adolescentes por significados que os convidem a participar da coletividade brasileira em convivência pacífica.

Tal captação decorreria, segundo penso, por via de estímulos a todos os grupos, em outras palavras, não há como buscar, com honestidade de propósito, a convivência pacífica entre os brasileiros se não houver políticas específicas de tolerância à diversidade.

terça-feira, 25 de junho de 2013

Conjunto de moradias ou depósito de gente?

Há uma mensagem significativa na arquitetura proposta para os Conjuntos Habitacionais, especialmente os destinados à Classe C. Há muito tempo esse tema me acompanha, a inquietar o pesquisador em segurança pública e instigar o cidadão.

Busquei imagens, na internet, de conjuntos habitacionais para encontrar o que eu já conhecia, parece que o projeto nos conduz a olhar os menos abastados (os pobres) ou do alto ou de longe, as moradias parecem se transformar em depósitos de gente, as pessoas moram em espaços diminutos, cercados de outras pessoas e com uma mensagem de “local fechado”. Normalmente não há portas à mostra.
 

 

Sendo um local fechado, normalmente com poucas, ou apenas uma, entradas para a população total, é claro que quem dominar a “portaria” exerce o controle sobre o que acontece no local, desde o bullyng até o tráfico de entorpecentes.

O mais complicado é que a vida é claramente enxotada, há espaço suficiente para centenas, ou milhares, de pessoas, mas não há padarias, restaurantes, etc; estes locais de convivência ficam “fora” do conjunto habitacional, não pertencem àquele local.
 
A contraposição a esta realidade é o condomínio de luxo (ou alto padrão), onde as imagens, normalmente, apresentam espaços amplos e, sobretudo, gente ocupando estes espaços e... vivendo.
 
Será que melhorar as condições de moradia corresponde a "depositar" a favela em conjuntos habitacionais segregados, à margem do espaço urbano público?

sábado, 22 de junho de 2013

A performance policial-militar é truculenta ou regulamentar ?



Me coloquei a analisar, na busca por significação, os ataques sistemáticos que incidem sobre a performance policial-militar. Parece-me que algumas pessoas, ingenuamente, realmente acreditam que o Brasil seria melhor sem policiais, especialmente os policiais militares (situação explorada neste blog: http://segurancapublicainterdisciplinar.blogspot.com.br/2013/01/um-mundo-sem-policia.html).

Penso que a questão, tanto pelo lado dos críticos "de carteirinha”, quanto dos policiais militares, reside em percepções diferenciadas da realidade e, sobretudo, na escala de valores que sustenta tais percepções, há necessidade de que as ações sejam compreendidas por lentes diferentes das usuais.

O trabalho policial-militar é analisado, e decodificado à população, por duas vias principais, os repórteres policiais (a incluir neste rol os especialistas em segurança pública) e os ativistas pelos direitos humanos.

Os repórteres policiais, em sua grande maioria, constituem-se em profissionais que nutrem laços de intimidade com o ambiente policial (conhecem quartéis, comandantes, delegacias, delegados, etc) e têm uma visão muito próxima da realidade policial, porém, no meu entender, visam a defesa das atitudes da Polícia, o que não é o mais adequado à imprensa.

Os ativistas pelos Direitos Humanos têm seu foco único, ao que tudo indica, às falhas da Polícia, e, por conta disto parecem entender que todos os problemas de segurança têm como nascedouro atitudes policiais-militares contra a população, quando muito incluem nesta conta os cidadãos rotulados como “da direita”, ou ainda, “capitalistas”.

Não há diálogo entre os ativistas e os policiais militares, no sentido de que as mensagens não produzem significação e, sem significação, não há entendimento mútuo e os discursos permanecem inalterados, a realidade também.

Quando um ativista define uma ação policial-militar como truculenta/violenta, ele não consegue produzir nenhum significado para policiais militares, visto que a violência é parte do serviço policial-militar, basta lembrar que quem porta uma arma de fogo ostensivamente é, em si, um enunciado de violência, logo a violência não é alheia ao policial, ao contrário, é parte integrante de sua rotina.

O percurso gerativo de sentido para policiais militares passa pelo filtro do regulamento, ou seja, o policial militar é formado para cumprir as normas constantes dos regulamentos e, neste diapasão, é muito mais contundente a mensagem de que uma atitude é contrária ao regulamento que ser rotulada de violenta.

A reflexão conduz às seguintes considerações: há um grave equívoco em culpabilizar policiais militares por ações que foram alinhadas ao regulamento. Para casos em que as ações forem reprováveis, muito mais adequado, a quem analisa e expressa opiniões, seria adotar o designativo NÃO REGULAMENTAR, ou mesmo analisar o regulamento e não o policial militar, em razão de que se o regulamento não for alterado a performance policial militar também não será alterada. Se há um ator violento e truculento a ser criticado, esse ator é o regulamento.

A atenção de quem analisa segurança pública, sobretudo no que se refere à atuação policial-militar, não pode ter como foco os policiais militares por suas ações, mas às regras pelas quais a performance policial-militar emerge, isto é, o policial militar não pauta seu comportamento profissional em razão de valores exógenos aos regulamentos, sejam eles quais forem.

Uma bala de borracha que atinge a perna de uma pessoa é tão violenta quanto a que atinge os olhos, todavia no último caso a ação é contrária ao regulamento, visto que as normas determinam não fazer "mira alta" ao lançar elastômeros contra manifestantes.

segunda-feira, 17 de junho de 2013

Os usos das calçadas: segurança (Jane Jacobs)

[...] Quando as pessoas dizem que uma cidade, ou parte dela, é perigosa ou selvagem, o que querem dizer basicamente é que não se sentem seguras nas calçadas.
Contudo, as calçadas e aqueles que as usam não são beneficiários passivos da segurança ou vítimas indefesas do perigo. As calçadas, os usos que as limitam e seus usuários são protagonistas ativos do drama urbano da civilização versus a barbárie. Manter a segurança urbana é uma função fundamental das ruas das cidades e suas calçadas.

Essa função é completamente diferente de qualquer atribuição que se exija das calçadas e das ruas de cidades pequenas ou de subúrbios verdadeiros. As metrópoles não são apenas maiores que as cidades pequenas. As metrópoles não são apenas subúrbios mais povoados. Diferem das cidades pequenas e dos subúrbios em aspectos fundamentais, e um deles é que as cidades grandes estão, por definição, cheias de estranhos. Qualquer pessoa sente que os desconhecidos são muito mais presentes nas cidades grandes que os conhecidos – mais presentes não apenas nos locais de concentração popular, mas diante de qualquer casa. Mesmo morando próximas umas das outras, as pessoas são desconhecidas, e não poderiam deixar de ser, devido ao enorme número de pessoas numa área geográfica pequena.

O principal atributo de um distrito urbano próspero é que as pessoas se sintam seguras e protegidas na rua em meio a tantos desconhecidos. Não devem se sentir ameaçadas por eles de antemão. O distrito que falha nesse aspecto também fracassa em outros e passa a criar para si mesmo, e para a cidade como um todo, um monte de problemas.

A barbárie hoje tomou conta de várias ruas, ou as pessoas sentem dessa maneira, o que dá no mesmo. “Eu moro num bairro residencial maravilhoso, tranquilo”, me diz um amigo que está procurando outro local para morar. “O único barulho desagradável durante a noite, de vez em quando, são os gritos de alguém sendo assaltado.” Não é preciso haver muitos casos de violência numa rua ou num distrito para que as pessoas temam as ruas. E quando temem as ruas, as pessoas as usam menos, o que torna as ruas ainda mais inseguras[i].


[i] JACOBS, Jane. Morte e vida das grandes cidades. 3ª ed. São Paulo: Editora WMF Martins Fontes, 2011. Páginas 29 e 30.

domingo, 9 de junho de 2013

Cada um se cuida como pode

A notícia sobre agentes particulares de segurança contratados por estabelecimentos de ensino para cuidar dos alunos dentro e fora do perímetro escolar indica o nível de (in)tranquilidade dos cidadãos das grandes cidades brasileiras.
A prática de obter segurança de forma particular não é nova (que o digam os banqueiros, os astros pop, etc, etc, etc), mas neste caso há um componente diferente, a vigilância se volta a um grupo de pessoas (os alunos), ou seja, o "patrulhamento" ocorre em local público dirigido ao público.

Destaco nesta questão que o Estado, antes ausente na falta de ações sociais/econômicas/políticas para controlar o crime e a violência, no caso específico da matéria jornalística, foi completamente destituído da função, ou seja, há tanto tempo o Estado parece estar inerte em relação à (in)Segurança Pública que algumas escolas resolveram decretar sua falência.
Esta situação, retratada na cidade de São Paulo, certamente ocorre em outros lugares deste país.
Outro ponto relevante se refere à pergunta que emerge da solução encontrada pelos mais abastados: Qual a sensação de segurança vivenciada por alunos de escolas públicas?
 
A evoluir na questão acima, há campo para outra reflexão: Apenas os alunos de escolas particulares (com condições de contratação de seguranças particulares) são vítimas do crime e da violência?

sábado, 8 de junho de 2013

Recontextualizando a liberação da maconha

Neste texto proponho uma recontextualização para o tema Liberação da Maconha. A recontextualização é uma técnica utilizada em solução pacífica de conflitos e tem como intenção a busca pelo entendimento de uma determinada situação problema em um novo contexto, e este novo contexto pode facilitar o entendimento do problema pelas partes em conflito, a dizer, é importante saber o que se passa com o “outro”.
Defensores da liberação dizem, entre outras coisas, que não liberar o consumo é um retrocesso, e é este ponto que quero usar como partida para uma provocação, no seguinte sentido: A liberação é para todos ou se presta a atender uma parcela específica da sociedade? Em outras palavras: Todos poderiam usar (digo, médicos, policiais, magistrados, etc), ou haveria uma restrição para determinadas situações?
Imaginem uma situação em que um juiz é dependente da “erva”, haveria aceitação inconteste às decisões desta pessoa de “cabeça feita” (em tese, livre para fumar “marijuana”) ou os manifestantes adotariam um outra posição?

terça-feira, 4 de junho de 2013

Planos dos lotófagos para a segurança pública



Conta Homero, no livro “Odisséia”, que Ulisses (Odisseu), em um dos episódios de sua volta ao lar, aporta em uma ilha, no norte da África.

Na ilha há uma tribo que se alimenta de lótus, uma flor branca com um poder mágico, qual seja, o de causar amnésia. As pessoas, ao comerem a flor, esquecem seu passado, vivem entorpecidos com o “hoje”.

Os tripulantes da nau de Ulisses passam dias e dias com os nativos e não lembram os motivos que os levaram a reconhecer a ilha, e não voltaram ao barco, até o momento em que o rei de Ítaca os resgata, amarrando-os em seus assentos e parte dali.

A figura dos lotófagos me ocorreu quando ouvi, de um amigo, sobre a entrevista, pelos idos de 1969, que o ilustre jurista Hely Lopes Meirelles concedeu, no exercício do cargo de Secretário da Segurança Pública do Estado de São Paulo.

Nesta entrevista, há mais de 40 anos, o Sr Hely afirma que a Polícia Militar precisa de mais efetivo e viaturas e que a Polícia Civil precisa de mais condições para investigar, com eficiência, os crimes.

O discurso é bem atual, aliás muito parecido com o que ouvimos de todos os secretários da pasta da segurança pública.

Ou melhor, o discurso não é atual, mas sim repetido e esgotado, a apresentar a visão “lotófaga” de quem não consegue lembrar as lições do passado, isto é, estão, as autoridades, a repetir a velha cantilena de que mais efetivo e viaturas é sinônimo de mais segurança, quando, na verdade, tal prática não conduz aos resultados desejados, visto que mais policiais patrulhando no mesmo contexto alteram muito pouco a sensação de segurança das pessoas nos espaços urbanos públicos...

 Sem mudança, contextual, nas condições de ética, saúde, educação, habitação, ofertas de emprego, lazer, garantia de dignidade para as pessoas, etc, não ocorrerão os resultados esperados, ou seja, ficaremos a repetir as mesmas práticas esperando resultados diferentes...