sábado, 2 de maio de 2015

Quem está atacando o cidadão brasileiro?

A indignação dá o tom da matéria veiculada pela televisão, sobre a violência e o crime no Centro da cidade do Rio de Janeiro.

O âncora do telejornal demonstra claramente sua revolta ante cenas terríveis, de pessoas atacadas com violência no centro da cidade mais famosa do Brasil, um dos cartões postais do mundo.

A perplexidade e a impotência transparecem na fala de uma entrevistada (na marca de 2 minutos e 51 segundos do vídeo):
Isso é um absurdo. Isso tem que acabar. Pelo amor de Deus, eu não aguento mais ver assalto nesse Rio de Janeiro. Eu não estou aguentando mais, todo dia, eu vejo assalto. Isso é uma gangue. Pelo amor de Deus, autoridades do Rio de Janeiro.
A quais autoridades, ela está clamando? Possivelmente aos gestores da Segurança Pública, visto que o questionamento, da TV, se volta à Secretaria da Segurança Pública e à Polícia Militar.

Neste blog há vários textos (indico É PRECISO CORRIGIR O RUMO DA PROSA e A REPETIÇÃO DA ANTIGA FÓRMULA...), a maioria, abordando a questão contextual como determinante à presença da violência e do crime, a considerar o trabalho policial como parte do contexto.

Ocorre que o trabalho policial não é o todo, mas sim parte do todo.

No dizer de dois pesquisadores temos que:
Em primeiro lugar, o aumento no número de policiais não reduz, necessariamente, as taxas de criminalidade, nem aumenta a proporção dos crimes resolvidos.

O mesmo ocorre com a “injeção de dinheiro” nos departamentos policiais, aumentando os orçamentos da polícia e da sua mão-de-obra.

É claro que, se não houver nenhum policiamento, haverá mais crimes. Mas, uma vez que um certo limiar tenha sido alcançado, nem mais policiais nem mais dinheiro parecem ajudar muito.

Tais medidas de controle do crime têm de fato algum efeito, mas constituem uma parte menos importante da equação.

As condições sociais, como renda, desemprego, população e heterogeneidade social, são indicadores muito mais importantes de variação nas taxas de crime e de resolução de crimes[i].
Levando em consideração que nada está alterado, positivamente, em relação a todos os demais componentes do contexto carioca (educação pública, saúde pública, taxa de desemprego, etc), não seria honesto criar a expectativa de que mais policiais e mais viaturas nas ruas iriam trazer sensação de segurança na medida em que é necessária.

Tendo como foco a matéria televisiva em questão, pode-se dizer que, em relação ao trabalho policial, vale destacar que a atuação de dois policiais militares contra uma gangue (como a que está registrada em vídeo) expõe-nos diante de um cenário, raramente divulgado pela mídia, de fragilidade ante o crime e a violência.

Hipoteticamente, imagine-se que uma viatura da PMERJ esteja no local e momento de um ataque (muito provavelmente os delinquentes escolheriam outro lugar); os dois policiais correriam atrás dos menores e, somente para continuar a linha de raciocínio, conseguiriam deter um deles (mais que um seria praticamente impossível); ao detê-lo, a primeira preocupação dos profissionais seria com a segurança do delinquente.

Se tudo corresse bem, o menor incólume, ninguém tentando impedir a condução à Delegacia de Polícia, a guarnição apresentaria a ocorrência policial ao Delegado. O Delegado iria analisar o caso, no momento em que isso fosse possível – as DP sempre estão com muitas demandas – e, ao final, verificaria se houve, ou não, agressão.

Como o Delegado não é legalmente competente para determinar lesões corporais, terá que enviar o detido e a vítima (para o caso em que a vítima “topasse” acompanhar os policiais à DP), para uma perícia médica forense, e por aí vai...

Vamos voltar ao local dos atos violentos-criminosos, a PM deteve um “acusado” de agressão e não está, por algumas horas, na rua, sobraram vários garotos da gangue – digo, de uma das gangues – para continuar sua atuação, com muitas “presas” à disposição. A caçada terá início novamente.

Estamos diante de um iceberg, só a ponta aparece, terrível, constrangedora e ameaçadora, mas é só a ponta...

Todas as outras autoridades (formais e informais), do Rio de Janeiro, que possibilitam, às gangues de rua, continuarem nas ruas “aterrorizando” os cidadãos cariocas, estão contribuindo com os ataques.

Cada notícia de milhões de reais desviados do erário para os bolsos de particulares também indica, pelo impacto em projetos de inclusão social[ii], que a violência e o crime ainda estarão conosco e, sobretudo, fora de controle, por muito tempo.





[i] SKOLNICK, J.H.; BAYLEY, D.H. Policiamento Comunitário: Questões e práticas através do mundo. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo, 2006, p. 67
[ii] Seja na educação, na distribuição de renda, na melhoria de vida por obras públicas, etc.