segunda-feira, 22 de abril de 2013

De dentro para fora


As percepções que se tem do espaço intra-urbano, das pessoas e das coisas está cada vez mais destacada, no sentido de apartada da realidade. A visão sistêmica do ambiente, sobretudo da cidade, tende à inexistência. Por isso as opiniões sobre as cidades serem tão díspares, talvez em razão de que os comentários se componham pelo olhar particular de quem fala sobre “sua” cidade.

O termo “sua cidade”, há tempos, traduzia-se em razão de uma questão geográfica, isto é, onde determinada pessoa nascera ou vivia. O onde abarcava o todo da localidade, a cidade toda, sem dúvida com as peculiaridades e significações sociais, culturais e políticas de cada “pedaço” da cidade mas, ainda assim, exprimia a ideia do todo.

A globalização e a tecnologia comunicam a ideia de amplidão, de que tudo está ao alcance das mãos, mais especificamente, da palma da mão, por via de um aparelho eletrônico.

Ocorre que, por absoluta impossibilidade de realização física, o espaço cibernético global, não está muito além da palma da mão, que o digam os milhares de internautas que twitan, facebucam, googulham o dia todo, freneticamente em seus dedos e olhos, mas parados; a rir, viajar, conversar, etc..., todavia no seu metro quadrado, destacados da multidão, conectados digitalmente (mentalmente, talvez), porém isolados fisicamente. Mesmo que os internautas estejam prensados no transporte urbano seus olhos passam pela janela da tela para o mundo, e, da janela, vivenciam tudo, observando sem odor, sem calor do sol, sem gosto...

A questão que toca mais de perto a (in)segurança pública é que este vivenciar destacado é mais que tecnológico, é cultural, ou seja, o comportamento e as significações também são destacados. Percebe-se o mundo pela janela do carro, com direito a uma cobertura a torná-la menos transparente, ou melhor, menos “conectada” com o ambiente exterior.

A percepção do outro se dá por uma janela também (televisão, computador, etc). O que ocorre com o outro se dá do lado de fora da janela, não há gosto, não há cheiro, não há tangibilidade para o que está a ocorrer com o outro, passa-se a um ponto em que o outro não importa, não existe... E essa é a grande violência, talvez a maior no mundo contemporâneo, morrem milhares e milhares de pessoas todos os dias, condenadas a inexistir por não passarem pelas janelas, sendo assim, o contingente de invisíveis está a crescer.

A violência que se segue é a expectante, visto que ainda que pessoas passem pelas janelas, tal condição continua a impedir a “existência física” (continua do outro lado da janela), destarte é possível acompanhar um tiroteio sem risco de balas perdidas, ou ainda roubos com violência pelo sistema de videomonitorização. Possibilitado está acompanhar qualquer tipo de tragédia sem sair de casa.

A contemporaneidade trouxe um novo tipo de voyeur, o observador da violência, a observar tudo do lado de dentro, sob a percepção de proteção, praticamente destacado do mundo real, visto que o mundo real está lá fora e o observador aqui dentro, pretensamente o “aqui” é longe do “lá fora”, entretanto a realidade diz que este “aqui” é imaginário e o “lá fora”, além de mais próximo do que se imagina, é hostil e inseguro.

A tradução mais fria da diferença entre o “aqui” e o “lá fora” são as estatísticas criminais, visto que o números são representantes de quem está “lá fora”, pessoas que são vistas de dentro do “aqui”...

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