sábado, 24 de janeiro de 2015

“O que fazer?” versus “Fazer o quê...”

Lá pelas quatro da tarde ouvimos, eu e minha esposa, ao longe, uma marchinha de carnaval, daquelas bem “família”. Descemos para ver a festa e curtir o momento.

A caminho do som entramos numa rua e percebi uma cena inusitada, uma moça agachada, minissaia levantada, urinando, junto à sarjeta, apoiada no espelho retrovisor de um carro com um braço e com o outro em uma amiga, que a acompanhava; próximos às duas, três rapazes aguardavam a jovem aliviar a bexiga.

Como narrei, ao princípio, o sol estava alto, dia claro, mas todos os cinco pareciam bem alcoolizados e não se importaram, até mesmo porque na próxima rua, um rapaz brindava um poste com “cerveja processada”.

A jovem estava defronte uma residência, e o carro que lhe serviu de apoio provavelmente pertence ao dono da casa.
Nossa primeira reação foi rir muito da situação, uma mulher com as nádegas expostas, a urinar na rua...

Logo após os risos passei a pensar no dono da residência. Então me coloquei na posição dele. O que eu faria se fosse comigo? Se fosse com o meu carro? Se fosse na frente da minha casa? Fingir que nada estava acontecendo? Ralhar com a jovem? O que fazer?

Mentalmente comecei a elaborar o percurso de solução, caso não concordasse em fingir que nada estava acontecendo, ou seja, se decidisse que não iria consentir com a situação.

Em primeiro lugar eu iria sair para pedir respeito, aí encontraria a primeira complicação, pedir respeito a uma jovem que está urinando na roda do meu carro? E os amigos que aguardavam na esquina? Difícil...

Se a indignação me levasse a chamar uma viatura policial para coibir a prática de ato obsceno em via pública, e, de fato, esta guarnição policial chegasse ao local a tempo e conduzisse as duas jovens e eu fosse junto como vítima, se todos estes passos ocorressem, talvez com grande dificuldade, mas que ocorressem, como seria na Delegacia de Polícia?

Em meio a tantos crimes mais sérios (roubos, homicídios, latrocínios, acidentes automobilísticos, etc), como seria esperar o registro do “xixi na frente de casa”?

Meu exercício imaginário de conduzir a ocorrência me levou à conclusão de que, na prática, fica “menos dolorido” fingir que não aconteceu nada e esperar a “mijona” levantar, vestir-se, rir com a colega, chamar os amigos e, finalmente, sair da frente da casa.

Para mim é uma questão de menor importância, moro num condomínio com portaria, e, na pior das hipóteses, o que preciso fazer é chamar o segurança para resolver a bagunça.

Para quem sofre o constrangimento recorrente não deve ser tão simples...

A questão me remeteu a um contexto mais complexo e preocupante, nosso cotidiano está “povoado” de situações inusitadas e incômodas que precisamos relevar, ou resolver por conta própria. Nenhuma das duas possibilidades é desejável, numa sociedade civilizada...

As pequenas raposas, ao roubar ovos, abrem espaço, nas cercas do galinheiro, para as grandes raposas roubarem galinhas.

O que fazer? Justiça ou vista grossa?

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